As conversas generativas nos conectam numa esfera eco e promovem novas maneiras de escutar e de pensar, não convencionais e para novos impactos. Por Clenir Schons Streit.
Com frequência, como Coaches ou Supervisores, notamos que um dos maiores desafios dosnossos clientes está em permanecer conectado com o que realmente importa. O envolvimentocom demandas e a pressão por cumprir tende a nos afastar do verdadeiro significado da vida e dotrabalho e assim corremos o risco de sermos guiados por ambições e buscas que não sãorealmente nossas. Com o passar do tempo, esta distância emocional nos afasta do nossoverdadeiro talento e potencial que nos torna únicos e especiais. Sabiamente, David Whyte,expressa em seu poema Working Together:
Nós nos moldamos para caber no mundo e pelo mundo são moldados novamente.
Como a vulnerabilidade nos torna únicos e especiais?
Este artigo aborda a vulnerabilidade como um espaço de aceitação de que há algo que ainda não desvendamos, que está por vir, que de alguma forma negamos pela sensação de desajuste, de tirar do lugar comum ou de nos afastar do que já está confortavelmente convencionado e em concordância com o papel e a imagem que assumimos frente ao outro.
Esta aceitação corajosa da nossa vulnerabilidade passa por um caminho de autocompaixão com relação as nossas incoerências e imperfeições, dúvidas e medos, fragilidades e inconsistências. Se não às tivéssemos, não estaríamos vulneráveis!
Talvez por isso negamos e tendemos a nos esconder e fugir, pois como seres humanos, é normal preferirmos o conforto dos caminhos mais seguros. Contudo, somos seres de corpo e alma surpreendidos pelos mistérios da vida. Cabe a cada um de nós a responsabilidade pela vida, o que não é tarefa fácil para ninguém.

Se optamos por viver intensamente, de forma a nos sentirmos mais completos ou mais amplamente conectados com todo o nosso sistema humano, relacional e ecossistema, certamente receberemos mais convites e sinais que podem inquietar, reacender a nossa capacidade de se indignar e provocar a vibração que move para transformações mais profundas em nós e ao nosso redor.
Esta reflexão por si só inquieta na medida que insere a vulnerabilidade como algo natural e inerente aos seres humanos conectados com o seu campo energético. Ou nos desconectamos e assistimos a vida passar ou embarcamos numa jornada ousada, recheada pelas convicções mais profundas acessadas pelo nosso core.
Prática 1- Acessando o nosso core
Qual o seu novo chamado agora?
O que faz você se sentir realmente contributivo?
O que você quer recriar a partir daqui?
Como nos movemos em parceria com a nossa vulnerabilidade?
David Whyte, em sua poesia, Start Close In, convida artisticamente para começar de perto:
Comece de perto, não dê o segundo passo ou o terceiro, comece com a primeira coisa por perto, pelo passo que você não quer dar.
As palavras de Whyte desafiam para um olhar nu e cru no espelho para uma ampliação daautoconsciência que dá autoria ao nosso primeiro passo:
Comece agora mesmo, dê um pequeno passo que você possa chamar de seu.
Por meio da sua poesia, Whyte nos mostra também como desbloquear o que William Blake chamou de “algemas forjadas pela mente”, se referindo às restrições e limitações que estabelecemos sobre nós mesmos e impomos em nossas próprias mentes. Dar o primeiro passo nos move para uma parceria com a nossa vulnerabilidade e maior libertação de nossas algemas.
Prática 1- Dar o primeiro passo
Qual o seu primeiro passo?
O que revela que este primeiro passo é “seu”?
Para onde te leva?
Como isso te liberta?
As diversas vozes e a nossa autoria
Caminhando um pouco mais com Whyte e sob o olhar atento à autoria que nos habilita a dar um primeiro passo que realmente possa ser o de cada um de nós, o desafio pode estar na conversa que não queremos ter, conosco e/ou com os outros.
Além do desafio de ter a conversa, com frequência, temos que lidar com as diversas vozes deste processo, sejam elas nossas ou dos outros. Interessante observar como estas vozes muitas vezes atuam acentuando os nossos medos, resistências, dúvidas e restrições, tudo a serviço de manter, proteger e salvar. Fica ainda mais difícil romper algo quando as vozes que escutamos dos outros também convergem para manter, proteger e salvar. Tendemos a nos desviar de nós mesmos dando vasão as mais diversas vozes que reforçam as nossas algemas.
A poesia de Whyte ilumina a nossa força e potência para um primeiro passo com a autoria das nossas vozes:
Siga a sua própria voz para encontrar a voz do outro, espere até que a sua voz se torne uma escuta particular
ouvindo o outro.

Prática 3- A escuta seletiva de diversas vozes
Quais conversas você necessita ter consigo e com os outros?
Onde você encontra vozes que iluminam caminhos?
Como nutrir mais vezes estas vozes?
Pedidos para parar o que você está fazendo agora e para parar o que você está se tornando enquanto você faz isso.
Perguntas que podem fazer ou desfazer uma vida.
Perguntas que pacientemente esperei de você,
Perguntas que não tem direito de ir embora.
David Whyte, Sometimes
Conversas Generativas
As conversas generativas ampliam a experiência para uma escuta muito além do preconcebido ou de um único ponto (ego). Quando o foco da atenção se expande, nos sentimos conectados a uma esfera maior (eco) com uma presença mais intensa que nos permite acessar outros recursos para lidar com a vulnerabilidade (Otto Scharmer).
Com frequência, em processos de supervisão em coaching, notamos que algumas intervenções usadas pelos coaches atuam de forma a deixar tudo claro e seguro. Se possível, infalível. Esta atuação tende a levar as conversas ao preconcebido, limitando a ousadia de ambos no campo mais amplo e inusitado (eco), e por isso também, mais criativo, original e emergente.
Como podemos colaborativamente transformar nossos sistemas?
As conversas generativas que nos conectam numa esfera eco, também promovem novas maneiras de libertar, de escutar novos chamados, de pensar em conjunto e de dar os primeiros passos para contribuir de outras formas, não convencionais, para novos impactos.
Qual o chamado para Eco Liderança?
Normalmente buscamos referenciais de ponta para falar de liderança pela constante evolução da pesquisa. Contudo, quando procuramos referenciais que tocam mais profundamente a alma e o propósito do líder, alguns precursores ganham vida, como Robert K. Greenleaf (1970) sobre o conceito de liderança servidora:
O líder servidor é primeiro servidor … Começa com o sentimento natural de que deseja servir, servir primeiro.
No caso da liderança servidora, a motivação de um líder deriva de uma crença central e igualitária de que eles não são melhores do que aqueles a quem lideram.

A liderança serve e atua no fortalecimento da confiança para, numa esfera eco, participativa e não hierárquica, uma nova visão de futuro possa ser criada. A filosofia de servir está na construção de organizações melhores e um mundo mais justo e solidário.
O desafio de desenvolver líderes que libertam
Se uma sociedade melhor deve ser construída, mais justa e mais amorosa, que ofereça maior oportunidade criativa para seu povo, então o caminho mais aberto é aumentar a capacidade de servir. Muito da performance das principais instituições servidoras existe pelas novas forças regenerativas operando dentro delas (Greenleaf,1970).
Líderes libertam algemas para atender a novos chamados que ajudam a construir uma sociedade melhor para todos. Libertam pela abertura para escutar e aprender com a sabedoria que emerge quando estamos conectados para ampliar caminhos e possibilidades de ser, interagir, sincronizar e transformar.
Referências:
Brown, Brené. Daring Greatly: How the Courage to Be Vulnerable Transforms the Way We Live, Love, Parent, and Lead. Penguin, London, 2012.
Greeneadf, Robert K – https://www.greenleaf.org/what-is-servant-leadership/. acesso em 19/06/2020.
Patterson, E. (2019) Reflect to Create!
The Dance of Reflection for Creative Leadership, ProfessionalPractice and Supervision. UK, London, 2019.
Scharmer, Otto. Liderar a partir do Futuro que Emerge – A Evolução do Sistema Econômico Ego-Cêntrico para Eco-Cêntrico. Elsevier Ed, RJ, 2014.
*Artigo publicado pela Revista Coaching Brasil, ed-86, autoria:
Clenir Schons Streit
Mestre em Administração,
Coach MCC/ICF, Mentora certificada internacionalmente
e Supervisora em Coaching credenciada pela CSA/Uk.
Facilitadora de processos de desenvolvimento de lideranças
e de transformação cultural
Diretora da Interação Consultoria